Uma cerca no lugar de um muro; um pequeno alpendre distante da grandeza de uma varanda mediana; teto de telha; paredes com as marcas do tempo; uma TV 20 polegadas sem tela plana em cima de uma antiga estante; a cozinha apertada faz frente a um quintal improvisado. Mas tudo por ali respira paz.
Se Orlandinho, o conhecido e estimado vendedor de algodão doce e picolé de Carmo do Rio Claro é um sujeito sereno e simples, José Benedito de Oliveira, o Dito, seu irmão mais velho, 75 anos, não é nenhum pouco diferente. Possuindo a mesma timidez que se mistura a uma invejável simpatia, sentado em um sofá na pequena sala de 2 sofás, um de 2 assentos e outro para 1, ele fala sobre a família com semblante cheio de admiração desde a infância no Distrito de Itaci, passando pela adolescência no bairro rural de Santa Rosa, até a chegada na área urbana carmelitana.
Ele comenta que a irmã, Maria da Consolação de Oliveira Simeão, mais conhecida como Consola, é a única que não mora com a família, na casa localizada na rua Paulo VI, no bairro do Rosário. Mãe de 2 filhos, casada há mais de 30 anos, reside na mesma cidade, no bairro do Porto.
Depois se diverte ao contar que aos 12 anos, quando soltou uma bombinha, teve um dedo cortado. A travessura de criança tornou-se um registro visível e para sempre. Ele detalha que à época, foi levado para a cidade de Campo do Meio, onde havia um acesso fácil por ainda não existir a represa de Furnas. “Eu gostava de fazer umas artes, era bem bagunceiro. Mas sempre trabalhei para ajudar nossos pais também. Na roça, a gente aprontava muito e trabalhava muito também”.
Enquanto Dito fala, sua irmã, Maria do Rosário de Oliveira, 60 anos, responsável em cuidar da casa, se divide entre preparar o almoço numa manhã de sábado, no mês de outubro e ir até a sala papear sobre as memórias da família com um sorriso tranquilo no rosto. Expressando saudade, ela resume seu sentimento em poucas palavras sobre seus irmãos falecidos, Arnaldo de Oliveira, o Nadinho e Antônio Ney de Oliveira, o Apaga Luz. “Sinto muita saudade deles”.
Nadinho morreu de repente enquanto trabalhava, era “juntado” como se diz por aí a casais que não são oficial ou legalmente casados, deixou uma filha e hoje seria avô de uma neta, relata Maria. Já Apaga Luz, assim como Orlandinho é um folclore na cidade, uma lenda que viveu carregando alegria e bondade. Uma figura memorável que gostava de tomar uma pinguinha. Ganhava uma grana limpando hortas nas residências do centro, brincava com todo mundo, ria feliz de si mesmo e desfilava a paixão pelo cruzeiro com a camisa azul celeste cidade afora.
Quando tomava umas biritas, as pessoas gostavam de desafiá-lo de brincadeira, e Apaga Luz, chamava para a briga com um robusto “vai embaçar?”, conta Dito aos risos. Vai embaçar virou um bordão conhecidíssimo, tão representativo quanto sua inigualável risada.
Apaga Luz faz parte de boas lembranças de uma geração de carmelitanos. Faleceu no dia 4 de fevereiro de 2012 e sua ausência na noite daquele dia deixou um vazio na Praça da Matriz, um dos lugares que mais frequentava e interagia com as pessoas.
Se Orlandinho e Apaga Luz são os irmãos populares, Dito e Maria possuem o mesmo carisma e simplicidade de ambos. Saudosistas, lembram dos programas de rádio que ouviam na época que moravam nas comunidades de Itaci e Santa Rosa. Os favoritos eram os Irmãos Zé Béttio e Osvaldo Bettio (pronuncia-se Osvaldo Betil).
A conversa tem agradáveis 47 minutos, até quando me levanto para despedir e agradecer à atenção pela prosa e entrevista cedida. Observo ainda alguns quadros que compõem as paredes da sala, entre eles, um com a foto do pai José Valetudi e da mãe Ermínia de Oliveira e de Apaga Luz na juventude. Quando meus olhos se voltam para o chão, o cãozinho de estimação, Caramelo, circula faceiro, feliz e atencioso pelo lugar. Um fiel retrato da família de Orlandinho.
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