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Reflexão sobre a “doença” do racista

por Rafael Marcon

A luta antirracista é incansável assim como o próprio racismo. (Créditos: Reprodução)


O racismo é crime. Isso todo mundo sabe. Não quero colocar neste texto algo que seja notável para todos. Se você ainda não entendeu o fato de que QUALQUER ato racista é crime, volte uma casa, e - somente depois disso - leia essa crônica. Mas vamos lá, em que situações esse escárnio cruel aparece em sociedade?


Há dois dias vimos um caso desses em Passos. Noticiado em primeira mão pelo portal g1.globo, e segundo consta o Boletim de Ocorrência da Polícia Militar, uma mulher de 42 anos disse a seguinte frase para um motorista de ambulância: “seu preto fedido, por isso que é preto, não presta para nada este preto”.

 

Pelo contexto, a fala se deu após a morte do pai, idoso, que foi atendido pelo SAMU com uma parada cardiorrespiratória e infelizmente não aguentou. Como eu disse, o fato está transparente, mas quero refletir com você quais foram as motivações dessa fala. Para deixar mais claro, porque em uma situação “à flor da pele”, o racismo foi revelado?

 

Na humilde opinião deste estudante de jornalismo, o racismo pode ser análogo a uma doença. Instaurada há séculos no país, é uma “doença” incurável neste momento. Na verdade, é uma “doença” inalcançável, porque a “cura” não vai chegar tão cedo.

 

Os sintomas. Em muitos casos, ela aparece numa simples intenção de ofender, como um ato de imponência. Em outros, acobertado por ignorância, é posto ao mundo na hora que a crise existencial bate: “vou diminuir o outro para que eu siga maior”. Talvez para diferenciação prática, é uma das únicas “doenças” que as sequelas afetam outro indivíduo a não ser aquele que a contraiu.

 

Há crueldade, há. Façanha hedionda que deve ser odiada. E também há uma nítida reprodução do pouco que comanda.

 

A causa. Vou explicar o que quero dizer… Veja, o negro é escanteado e sofre com condições desiguais no presente por ter sofrido com condições desumanas no passado, ponto. Somente a cor da pele já o torna alvo. E não é como se o erro tivesse sido apagado. Está aí, segue de pé, presente em Passos, ou em qualquer canto do Brasil.

 

Por ser muitas vezes silencioso, é muito maior do que parece. É um legado ruim que se arrasta pela multidão. Começa no topo da pirâmide do poder e se alastra por toda ela. Por isso, é difícil visualizá-la. Nós, seres humanos, seguimos ícones desde que nascemos. Desde o filho para a mãe até do filho para o neto. Nossas referências, nos constroem.

 

A luta. No país, o elemento mais vívido para que uma sociedade não repita erros é amargurado: a educação é pouco potente. Pelo menos, os detentores da maior parcela de poder não querem que seja. A “cura” está na mão deles, mas o bom é continuar do jeito que está: o gato caçando o rato.

 

A sensação é de uma batalha injusta. Ainda sem a “cura” em mãos, resta tentar cortar o mal pela raiz. O povo preto luta. “É melhor atirar-se à luta em busca de dias melhores, mesmo correndo o risco de perder tudo, do que permanecer estático, como os pobres de espírito, que não lutam, mas também não vencem, que não conhecem a dor da derrota, nem a glória de ressurgir dos escombros” (Bob Marley).

 

Leia a bula. A educação é inalcançável. A alienação é real. O contraste entre pobreza e riqueza de recursos é sim elemento crucial para as mazelas sociais.

 

Cheguei a ouvir dentro de uma universidade que a alienação não existe. Isso é o próprio princípio da alienação. Cheguei a ouvir dentro das religiões, falas contraditórias que ressaltam preconceitos. Isso é essencialmente distorção de espiritualidade. Ouvimos frequentemente de presidentes e governantes, incitações absurdas para um cargo de comando. "Esquerda de lá, direita de cá, e o povo segue firme tomando no centro" (Djonga).

 

Agora voltando no caso que comecei este texto, a mulher foi presa. De acordo com o artigo 140 do Código Penal, injúria racial é reclusão de até cinco anos. Cinco anos, no máximo, sendo bem inocente ainda. Sem “acompanhamento clínico”, sem nada. Mais cinco anos “doente”. Mais toda uma vida “doente”. Mais toda uma vida reverberando e sendo reflexo para este mal.

 

Pessimismo ou realidade. Ainda sim, na opinião do que vos fala, ser um fantoche pernicioso vai muito além de querer ser ou querer não ser. Mas se você é, você é condenável. É condenável porque, mesmo não sendo eles, já faz parte. É condenável porque não é a vítima, é o controle.

 

Assim vai seguir. Quando a polícia fizer seu trabalho, como foi neste caso, e quando não fizer. O racismo vai seguir numa sociedade manchada já na própria organização. E eu te pergunto: chegará o dia em que quebraremos essa linha? Atualmente, parece impossível a olho nú.

 

Pelo menos, tenho uma certeza: a batalha vai ser muito longa.

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